Em artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Ricardo Alban, fala sobre a economia brasileira
A recente alta da taxa básica de juros no Brasil, a Selic, tem provocado discussões um tanto acaloradas entre especialistas econômicos e líderes empresariais. É preocupante que o aumento da capacidade instalada na indústria seja usada como justificativa para a elevação dos juros.
Aqui há questionamentos importantes de se fazer. Afinal, por que tantas narrativas são criadas para justificar algo que muitos consideram irracional? Qual é o verdadeiro papel do mercado financeiro nesse cenário, e por que ele parece ditar os rumos da política monetária nacional? Até quando?
A pressão sobre a capacidade instalada da indústria brasileira tem origem no histórico de juros astronômicos praticados no Brasil. O alto custo do crédito impede que as empresas invistam na expansão de suas plantas e aumentem sua produção, agravando o gargalo da oferta e, por consequência, a inflação.
A solução para a equação parece óbvia: uma taxa de juros mais racional, alinhada às praticadas em outras economias emergentes, incentivaria investimentos produtivos, o que resultaria em uma redução da pressão inflacionária, além de criar mais empregos e desenvolvimento. Às vezes é preciso dizer o óbvio.
Economias como a da China, que recentemente adotaram medidas de estímulo ao crescimento industrial, reforçam a tese de que uma política de juros equilibrada pode servir de alavanca poderosa para o desenvolvimento. No Brasil, no entanto, o cenário atual de juros elevados bloqueia a expansão industrial, justamente quando a economia brasileira está se recuperando e a indústria tem desempenhado um papel importante nessa recuperação.
Enquanto presidente do G20, que reúne as maiores economias do mundo, o Brasil só tem ao lado Índia e Rússia quando o assunto é política monetária. Enquanto os três subiram juros, os outros 14 integrantes do G20 decidiram por cortes na taxa básica.
Atualmente, a Selic está em 10,75%. Já os custos para a indústria podem chegar a taxas entre 25% e 30% ao ano. O impacto ao longo das cadeias produtivas, e nunca é demais lembrar que a cadeia da indústria é longa, é devastador.
O custo financeiro embutido no produto final pode representar até 25% do preço ao consumidor – uma situação insustentável para a competitividade do setor industrial brasileiro.
Outro ponto controverso é a narrativa que orienta a política monetária no país, inclinada a se basear na pesquisa FOCUS. A pesquisa é respondia por 170 empresas e instituições, mas chama a atenção que apenas 8 não são diretamente ligadas ao setor financeiro.
Isso levanta uma questão importante: até que ponto as perspectivas da economia real, especialmente da indústria, comércio e serviços, são efetivamente consideradas na formulação das políticas econômicas?
A crítica que emerge é clara: a política de juros no Brasil parece estar moldada em benefício do mercado especulativo, em detrimento da economia produtiva. O setor agropecuário e o sistema financeiro têm vozes fortes – e levadas em consideração – no debate econômico.
Nada mais justo que a indústria também tenha suas demandas ouvidas e, principalmente, consideradas.
Se o Brasil quer mesmo evitar perder mais oportunidades de crescimento, precisa rever o papel dos juros na política econômica. O Brasil precisa de uma política industrial consistente e de uma visão de longo prazo, onde o incentivo ao investimento produtivo ocupe lugar central.
Assim,construiremos um país que privilegie o desenvolvimento e o bem-estar social, ao invés de manter o foco no lucro especulativo de curto prazo.
*Ricardo Alban é empresário e presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
O artigo foi publicado no jornal Folha de S.Paulo, no dia 20 de outubro.