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    Regulamentar Marco do Saneamento na direção certa passa por definição de metas 

    Regulamentar Marco do Saneamento na direção certa passa por definição de metas 

    A aprovação, pelo Congresso Nacional, da Lei 14.026/2020, que institui o novo marco legal do saneamento básico, foi, sem sombra de dúvidas, o maior passo na história recente do Brasil para enfrentar as péssimas condições sanitárias em que vive quase metade dos brasileiros. Segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2017 o país estava em 117º lugar quanto ao percentual da população com acesso a saneamento, com implicações em temas como saúde das famílias, educação das crianças, produtividade dos trabalhadores e competitividade das empresas. Com mais de 100 milhões de brasileiros e uma elevada proporção de escolas sem saneamento, além do crescimento de doenças transmitidas pela água num ritmo bem superior ao da população, a situação há muito tempo se tornou insustentável.   

    O setor de saneamento básico é dominado por entes estatais: departamentos e autarquias no âmbito municipal, e 26 empresas nos estados e no Distrito Federal. Esse aparato detém 93% do mercado, fatia obtida sem competição; opera sob um regime regulatório falho e fragmentado; está sujeito a contratos frágeis (quando existem), que pouco vinculam em termos de obrigações, metas e penalidades pelo descumprimento; e se caracteriza por uma governança que não impede a intervenção dos governos. Existem algumas exceções a esse quadro negativo, mas ainda insuficientes.   

    Um dos motivos pelo atraso do país em saneamento é a ausência, para as entidades públicas, de metas de cobertura, qualidade e eficiência operacional. Diferentemente, os contratos de concessão assinados pelos provedores privados dispõem de metas, como a de universalização, e de penalidades pelo descumprimento, estabelecendo a obrigação do órgão regulador de monitorar, fiscalizar e sancionar pelo eventual não cumprimento de tais objetivos. O novo marco legal reduz essa assimetria, devendo atrair outras empresas, que competirão em bases de igualdade com o setor público. A população só tem a ganhar. 

    A nova legislação fará com que todos os municípios e regiões metropolitanas se obriguem a universalizar os serviços de saneamento em sua área de atuação até 2033. Vale sublinhar que não apenas essa meta já constava do Plano Nacional de Saneamento Básico de 2013, como, há anos, outra legislação obrigava que contratos assinados entre entes públicos devessem conter metas de desempenho monitoráveis com sanção pelo descumprimento. A Lei 11.107/2005, ao regulamentar o artigo 241 da Constituição, afirma que “contratos de programa” deveriam atender à legislação de concessões e permissões de serviços públicos. Mas esse comando vem sendo sistematicamente descumprido há 15 anos. 

    Daí a importância de dar seguimento ao marco legal recém-aprovado tomando as iniciativas relevantes para sua efetividade, como a definição de uma metodologia que avalie a capacidade econômico-financeira dos atuais e futuros provedores dos serviços para atender às metas de desempenho. Obviamente, é essencial garantir o cumprimento dos termos acertados e o atendimento das necessidades da população. Os contratos estarão condicionados à comprovação da capacidade da empresa de cumprir suas obrigações. Assim, aguardamos a edição do decreto presidencial com a metodologia para a comprovação de capacidade econômico-financeira dos provedores, essencial para dar eficácia à nova lei. 

    O poder transformador da lei se dará na exata medida em que fizer cumprir o mandamento de um novo arcabouço contratual que vincule todos os contratos de prestação de serviços públicos de saneamento básico às metas de universalização (atendimento de 99% da população com água potável e de 90% da população com coleta e tratamento de esgoto). É preciso estabelecer metas quantitativas de manutenção contínua do abastecimento, de redução de perdas de água e de melhora dos processos de tratamento. Sempre haverá vozes céticas que dirão que tais metas são muito ambiciosas e que não haverá recursos para tal. Discordamos. 

    Um marco regulatório sem ambiguidades, que aponte para um mercado aberto e sem privilégios; uma agência com autonomia decisória, financeira e administrativa; e contratos vinculantes com equilíbrio entre risco e retorno são características que atrairão investidores e operadores capazes de responder à enorme demanda do país. As inovações que a lei trouxe, inclusive na formação de blocos de prestação de serviços em bases regionalizadas, que agregam municípios mais ricos e outros com menor capacidade, são soluções relevantes no contexto de grandes diferenças entre o interior e as capitais dos estados. 

    Os vetos feitos pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, que contribuam para agilizar a solução dos problemas devem ser mantidos pelo Congresso Nacional. As razões dos vetos falam por si: o país está extremamente atrasado e precisa acelerar a transição para um ambiente em que todas as empresas – públicas e privadas – possam competir em igualdade de condições. Quem ganha é o cidadão, especialmente os habitantes dos 1.067 municípios que não possuem contratos ou cujos contratos não vinculam os provedores a qualquer obrigação de eficiência.   

    A situação atual do Brasil na área de saneamento básico é inaceitável. Não podemos esperar mais para acabar com essa calamidade. O primeiro grande passo foi dado, mas precisamos seguir na direção correta, regulamentando a nova lei com clareza e rapidez. Dessa forma, o país poderá atender com dignidade todos os brasileiros, oferecer condições adequadas de saúde à população e retomar o caminho do desenvolvimento econômico e social. 


    *Presidente da CNI 

    O artigo foi publicado no portal Poder 360, nesta terça-feira (18). 

    Fonte: Agência CNI

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