Depois da aprovação do marco legal do saneamento básico, o Congresso Nacional precisa retomar a análise e a votação da lei que modernizará o mercado brasileiro de gás natural. A legislação atual, aprovada em 2009, é insuficiente para promover as transformações necessárias ao setor, como a quebra de monopólios, a ampliação dos investimentos e a redução do preço desse importante insumo para a indústria.
Atualmente, a tarifa cobrada pelo gás natural dos consumidores brasileiros – uma das mais altas do mundo – representa um obstáculo à competitividade da economia nacional. No ano passado, o preço do combustível para o setor industrial ficou entre US$ 13,50 e US$ 14 por milhão de BTU (unidade térmica britânica), mais do que o triplo da média de US$ 4 praticada nos Estados Unidos e o dobro da dos países europeus. Mesmo no Japão, que importa quase 100% do gás natural que consome, os preços são inferiores aos do Brasil.
Nós dispomos de reservas significativas de gás natural. Com a exploração do pré-sal, a produção doméstica, de cerca de 124 milhões de metros cúbicos ao dia, poderá dobrar nos próximos dez anos. A expansão da oferta, combinada com estímulos adequados e um ambiente regulatório seguro, permitirá a redução do preço do insumo.
Os efeitos multiplicadores da equação que une oferta abundante e preços competitivos do gás natural sobre a economia brasileira estão estimados em estudos recentes da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Entre os impactos positivos, destacam-se a expansão do consumo, a atração de investimentos e a conservação do meio ambiente.
As projeções indicam que, com uma queda de 50% nos preços, a indústria intensiva em energia triplicará o consumo de gás e poderá ampliar os investimentos em R$ 150 bilhões em 2030. Além disso, muitas empresas serão incentivadas a substituir de 50% a 80% do carvão utilizado nos processos de produção por gás natural, contribuindo para a redução das emissões de poluentes, que provocam o efeito estufa.
No entanto, a materialização dessas estimativas depende da aprovação do Projeto de Lei nº 6.407/13, que está pronto para votação e é o principal instrumento para a efetiva redução dos custos do gás natural no país. As mudanças previstas no texto, que está em discussão há sete anos no Congresso Nacional, são cruciais para promover o tão esperado choque de energia barata, anunciado pelo governo em junho de 2019, no lançamento do Programa Novo Mercado de Gás Natural.
De lá para cá, os esforços do governo para enfrentar o monopólio no setor na proposição de ações infralegais para a abertura do mercado foram muito importantes. Entretanto, o país ainda espera a efetiva diversificação dos atores e os investimentos necessários para adequar a cadeia de gás natural às exigências de um mercado cada vez mais competitivo.
É importante lembrar que, no passado, o sistema elétrico brasileiro era considerado um dos mais eficientes do mundo e representava uma importante vantagem competitiva para o país. Com a fonte hídrica responsável por quase 65% da matriz elétrica, assegurada por grandes reservatórios de regulação e um sistema interligado por uma ampla rede de transmissão, a energia no Brasil era barata.
Infelizmente, ao longo dos últimos anos, os custos da energia aumentaram, devido a uma série de problemas, entre eles a proliferação de taxas e encargos setoriais incidentes sobre as tarifas. Além disso, a utilização maciça de termelétricas de alto custo em períodos de escassez de água nos reservatórios das hidrelétricas elevou ainda mais os preços da energia.
Por isso, a aprovação do PL nº 6.407/13 é uma chance que não pode ser desperdiçada. Um novo marco legal para o gás natural, com regras claras para os vários elos da cadeia – produção, comercialização e transporte – se adequarem às exigências do mercado, está entre as ações indispensáveis para que o setor energético volte a ser uma vantagem competitiva para a economia brasileira.
A abertura do mercado à competição e a queda do preço do gás natural de forma consistente são cruciais para o país superar a grave crise provocada pela Covid-19. Com oferta e tarifas adequadas às demandas da indústria, o Brasil terá melhores condições para atrair investimentos, enfrentar a acirrada concorrência externa, retomar o crescimento econômico e criar empregos no pós-pandemia
* Presidente da CNI
O artigo foi publicado no jornal O Estado de S. Paulo, nesta terça-feira (28).