Está mais do que na hora dos setores públicos e privados se unirem para elaborar um planejamento estratégico, com vistas a viabilizar uma retomada gradual das atividades produtivas, a partir do momento em que as autoridades sanitárias considerarem mais adequado e seguro.
As medidas que têm sido implementadas pelo governo – várias delas sugeridas pela Indústria – têm ajudado as empresas a suportar o isolamento social imposto pela pandemia da Covid-19, incluindo a preservação de grande parte dos empregos. Entretanto, não podemos esperar de braços cruzados a hora da reativação da produção, sob pena de a volta às atividades ocorrer de maneira improvisada.
É necessário que seja elaborado, urgentemente, um plano consistente, que projete cenários e preveja a realização de ações efetivas no pós-pandemia. Como os recursos privados serão limitados, em função da brusca interrupção de empreendimentos comerciais e industriais, o Estado terá papel fundamental para uma retomada sustentável economia. Neste sentido, é urgente facilitar o acesso ao crédito, pois os recursos liberados pelo governo não estão chegando no caixa das empresas.
O governo precisa, ainda, sinalizar como pretende criar as condições necessárias para aumentar a produção industrial, que, de acordo com o IBGE, acumulou uma queda de 26% em março e abril. Recente pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI) revelou que apenas 13% das empresas do setor não sentiram efeitos econômicos negativos da pandemia, enquanto 84% foram prejudicadas.
Para fazer frente a este desafio, consideramos que as iniciativas governamentais deverão priorizar o reaquecimento do setor de construção civil; a atração de investimentos em infraestrutura, em especial com concessões na área de transportes; a implementação do novo marco legal saneamento básico, aprovado recentemente pelo Congresso Nacional, e a expansão do setor elétrico. A mobilização das cadeias produtivas destes e de outros setores, no cenário da severa recessão que se anuncia, será essencial para a sobrevivência das empresas e, por consequência, para a preservação de empregos.
Em todas as épocas, especialmente em períodos de crise, deve-se adotar uma atitude pragmática. Por isso, agora mais do que nunca, não há vantagem em se prender a conceitos absolutos de liberalismo ou estatismo. Sem a participação ativa do Estado, o Brasil e o mundo não conseguirão superar essa grave crise. Em grandes turbulências anteriores, instrumentos e recursos disponibilizados pelos governos foram imprescindíveis para que os países resgatassem o caminho da expansão. Foi assim na Grande Depressão de 1929, quando o governo do presidente americano Franklin Delano Roosevelt implementou o New Deal, ambicioso programa de medidas econômicas e sociais que viabilizou a recuperação da economia dos Estados Unidos e de outras nações afetadas.
Processo semelhante ocorreu durante o caos financeiro iniciado em 2008, que levou bancos centrais dos principais países a injetarem trilhões de dólares na economia global para minimizar o tamanho da queda das atividades econômicas. Naquela ocasião, mesmo o governo americano, acostumado a práticas mais liberais, deixou de lado vários tabus econômicos. Com aporte de recursos públicos, salvou da falência diversas instituições financeiras, seguradoras, companhias aéreas e mesmo segmentos da indústria, como o automotivo.
No Brasil, para ajudar o país a enfrentar as consequências econômicas da atual pandemia, governo e Congresso já tomaram duas medidas relevantes. A primeira foi o auxílio de R$ 600 mensais para trabalhadores informais ou que perderam o emprego – o que está permitindo que as famílias mais pobres se sustentem. A outra foi o programa que autoriza empresas a fecharem acordo com empregados para reduzir as jornadas de trabalho, com diminuição proporcional nos salários. A iniciativa preserva empregos e dá um alívio temporário ao caixa das empresas.
No atual estágio, a Indústria considera que, além da facilitação do acesso ao crédito, é necessário que o governo aja para melhorar as condições de financiamento emergencial para capital de giro das empresas. Obrigadas a suspender suas atividades, em função da pandemia e das restrições ao comércio, as indústrias tiveram uma queda drástica de receitas, que se mostram insuficientes para pagar despesas fixas, elevando a possibilidade de inadimplência. Estas medidas são essenciais para que os recursos cheguem a tempo de evitar a desestruturação maciça do setor produtivo nacional.
O planejamento estratégico para a superação da crise deve prever ainda a retomada da agenda de reformas estruturais, sobretudo a tributária, interrompida devido à eclosão da pandemia. Outras prioridades são a reestruturação do setor elétrico, a atualização de normas para o licenciamento ambiental e o aumento de investimentos em tecnologia e inovação.
O combate à insegurança jurídica também é crucial para a recuperação dos investimentos, em particular os estrangeiros; a formação de um ambiente mais propício para negócios; e o aumento da competitividade do país com relação a outras economias. Caso não tome essas providências, o Brasil poderá ficar a reboque na nova ordem mundial que, certamente, emergirá no pós-pandemia.
*Presidente da CNI
O artigo foi publicado na Revista Veja, nesta sexta-feira (3)